OBJETIVO DESTE BLOG

Compartilhar textos, poemas e impressões de uma forma mais literária sobre sustentabilidade; em um livro vivo - esse é o objetivo básico desse blog. Aqui busco tecer relações entre o conhecimento científico e outros saberes e sabores, outras visões de mundo. Há sugestões de atividades e perguntas que provocam e/ou convidam à reflexão. Os poemas estão protegidos pela Lei de Direitos Autorais na Biblioteca Nacional (Lei 9.610/98). A reprodução dos textos é permitida desde que citada a fonte e/ou respectivas referências bibliográficas. Aviso Importante: As postagens (textos e atividades) são dinâmicas e serão atualizadas independente do mês que foram escritas. Boa Leitura! Mande-me sugestões.

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Embalagens, estilo de vida e meio ambiente


Entrevista concedida à Revista Ecologia Integral - (Especial Resíduos) - nº 31 – páginas: 23 e 24 - Uma publicação do Centro de Ecologia Integral – http://www.ecologiaintegral.org.br/



Após traçar o panorama da evolução das embalagens na publicação A evolução da embalagem, quais seriam as suas conclusões sobre este processo que estamos vivendo de estilo de vida e produção de resíduos?

As embalagens se sofisticaram muito com o passar do tempo. Dos chifres e conchas usados inicialmente até as so­fis­­ticadas embalagens que vemos nos supermercados há toda uma história de evolução da ciência, do marketing, da psicologia. Cada dia que passa, as prate­leiras estão sendo invadidas por produtos em embalagens complexas de grande apelo visual, cuja mistura de materiais dificulta e/ou impede a reciclagem. Os produtos colocados na prateleira são colocados para agradar a nós, consumidores. Se simplesmente nos deixamos con­duzir pela beleza aparente das embalagens, sem ter uma postura do “por quê”, “para quê”, “quanto custa”, “qual o benefício geral que o produto me propor­ciona” e “de onde vem?, para onde vai a emba­lagem do que estou comprando?”, fica difícil para as empresas mudarem suas escolhas em relação aos sistemas de produção e imple­mentar mudanças em suas embalagens. As que adotam medidas de proteção am­biental muitas vezes enfrentam a concorrência de empresas que têm pouca ou nenhuma preocupação socioambiental. Além de uma boa admi­nistração, as empresas dependem de nós para manterem sua saúde financeira. Desta forma, nós consumidores precisamos assumir nossa parcela de responsabilidade ambiental e nosso poder de mudar aquilo que dizemos que não concordamos. Precisamos ser pró-ativos: se compramos sem levarmos em conta a questão socioam­biental, favorecemos empresas que também não têm essa preocupação.

A sociedade atual está disposta a abrir mão da praticidade das embalagens e dos descartáveis pela preservação do planeta?

Nas minhas aulas de Ecodesign e Produção Mais Limpa, sempre destaco de que não há necessidade de voltarmos para a idade das cavernas. As embalagens são necessárias. A forma com que elas são feitas é que deverá mudar à medida em que formos curando nossa miopia tecnológica e cultural. Estamos passando por um período de transição de mentalidades. A natureza tem suas próprias emba­lagens com design atrativo, estética, funcionalidade e biodegradabilidade. Nós devemos incorporar princípios ecológicos à tecnologia nesse século, para continuarmos a existir. É necessário abrir mão de alguma praticidade? As vezes sim, por exemplo, nos auto-educando a levar uma sacola para as compras do supermercado para reduzir o uso o consumo das sacolas descartáveis. Se estamos dispostos? Essa resposta para mim é individual. Cada pessoa deve saber de suas próprias limitações e cobrar a mudança das empresas na mesma proporcionalidade de que cobra mudanças em seu próprio comportamento. Empresa são organizações humanas, espelham o com­portamento da sociedade. Não tem mágica no processo.

Na sua opinião, como a questão das embalagens e resíduos se relaciona com os conceitos da ecologia integral?

Essa é uma questão complexa... A natureza tem embalagens, tem resíduos mas não gera lixo e todas as suas embalagens são biodegradáveis, servem de matéria- prima para outros seres vivos. Nós humanos, com a nossa tecnologia, capaz de manipular a matéria através do conhecimento da Química e Física, criamos o que chamamos de lixo. Boa parte deste “lixo” não é biode­gradável e, portanto, não entra novamente nos ciclos biogeoquímicos, que é por onde circulam os átomos na natureza. Aprender a trabalhar com a matéria como a natureza faz é um processo de evolução da consciência humana e é ai que entra o Ecodesign: aplicar os princípios ecológicos nas tecnologias humanas e, mais especi­ficamente, na confecção de embalagens sustentáveis. É um desafio de toda a indústria mundial. Já vemos isso começar a acontecer com a criação dos plásticos derivados de mandiocas, por exemplo.

As pessoas precisam ter consciência de que o mundo ao seu redor espelha o que ela tem dentro de si. Há autores que discutem o lixo na dimensão da nossa dificuldade em lidar com a morte. Produtos que não são biodegradáveis não morrem, são “eternos”. Nosso corpo não é eterno, é matéria: “Viestes do pó e ao pó retornarás”. Essa frase bíblica é muito sábia. Também um químico chamado Lavoisier foi muito sábio ao dizer: “Na natureza nada se perde, nada se cria, tudo se transforma”. A natureza é movimento, é o Tao, é o caminho. Nós temos dificuldade em termos uma visão de vida dinâmica. Nossa sociedade não foi construída dentro de um paradigma biocêntrico (centrado na vida). Aprendemos que todo o planeta deveria servir a uma única espécie. Agora estamos colhendo os frutos desta escolha.

Todos pertencemos a uma só raça: a raça humana, que está em evolução. O lixo, o material não reciclável são símbolos. A sujeira física está ligada à poluição mental, psíquica, emocional. Se arrumarmos nosso primeiro “oikos”, nossa primeira casa, arrumaremos o mundo. Isso é a ecologia pessoal influenciando a ecologia ambiental, a meu ver. Precisamos de atitude. Temos visto muitos consumidores exigirem mudanças das empresa e do governo sem uma mudança de atitude para atos rotineiros de consumo. Seria muito bom se os ambi­entalistas ou educadores ambientais que fumam estabe­lecessem e divulgassem suas próprias metas de redução de consumo de cigarro, por exemplo. Também seria muito bom se todas as pessoas donas de automóveis preocupadas com a preservação ambiental colocassem um catalisador novo sempre que o que vem em seu carro terminar a vida útil. Eu estabeleci uma meta pessoal: reduzi o meu consumo de carne a uma vez por semana. Uma contribuição para a redução da minha parcela do aquecimento global. Acima de tudo, estou cuidando de mim. Isso é parte do egoísmo saudável. E quem está disposto a assumir a própria parcela de responsabilidade? Mudar organizações complexas requer mudar pessoas que estão dentro delas e que são iguais a mim e a você. Também não tem mágica.


Sabemos também que muitas pessoas estão interessadas em fazer as coisas certas, mas não têm informação adequada ou apoio de prefeituras e órgãos públicos para a destinação correta dos resíduos. Como resolver esta questão?

Na minha opinião, não há mais tempo para esperar! De um lado, as pessoas precisam de parar de esperar apoio de prefeituras e órgãos públicos. As pessoas precisam assumir o próprio poder. Quem quer informação, hoje, se for atrás, consegue. Há bibliotecas, salas verdes, centros de educação ambiental públicos e privados, livros, jornais, vídeos, murais nas escolas, revistas, internet. E, acima de tudo, há pessoas interessadas em se juntar a outras pessoas para trocar experiências, trabalhar em redes, inclusive de educação ambiental, associações, clubes, movimentos organizados.
De outro lado, as pessoas precisam aprender a fazer valer seus direitos de cidadãos e cidadãs mediante o poder público. Então precisam aprender sobre leis, direitos e deveres. As pessoas precisam aprender a votar, e a fazer política, deixando de lado a politicagem. O consumo em si é um ato sobretudo político. Com a minha compra eu mantenho vivo todo um processo produtivo, econômico quer seja ele social e ambientalmente responsável ou não. Então assumir responsabilidade passa por se assumir como um ser político.

O que os idealizadores esperam com a publicação A evolução da embalagem?

O objetivo maior da publicação é contribuir para a formação de consumidores mais críticos e conscientes em relação as suas próprias escolhas; que tenham atitudes de compra que privilegiem a proteção ambiental. Isso tem a ver com um processo de formação na qual as escolas têm um papel fundamental. Existe uma preocupação grande dos idealizadores do projeto de que a publicação chegue efetivamente às mãos de alunos e professores das escolas estaduais. Além disso, a publicação tem a preocu­pação de contextualizar as embalagens através da história humana, dando visibilidade ao ciclo de vida dos materiais.


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*A entrevistada foi responsável pela pesquisa e elaboração do texto da publicação “A evolução da embalagem: informações para uma nova geração de consumidores conscientes”. A publicação foi um projeto do SINPAPEL. Os interessados em adquirir a publicação devem entrar em contato com o Sinpapel, através do telefone (31) 3282-4755 ou pelo email sinpapel@fiemg.com.br

Os desafios na implantação de tecnologias limpas nas empresas do Brasil

A Agenda 21 destaca a importância da colaboração entre países dos hemisférios norte e sul assim como o uso de tecnologias limpas associadas à mudança comportamental. As empresas brasileiras, no entanto, encontram várias dificuldades na implementação de mudanças no processo produtivo, como por exemplo: a falta de incentivos fiscais, a elevada carga tributária, o preço da tecnologia, dentre outras. Grandes resistências na implementação de novas tecnologias também estão associadas à mudanças comportamentais de funcionários. Atualmente, as empresas brasileiras estão saindo do paradigma da cultura de fim de tubo – instalação de filtros e ETEs, tratamento dos resíduos, disposição final, recuperação de áreas contaminadas – para a cultura preventiva que envolvem a prática dos 4 Rs: Repensar, Reduzir, Reutilizar e, por último Reciclar. A evolução do Repensar leva à adoção do Ecodesign de produtos e serviços, incluindo todo um Repensar Organizacional para a prevenção da geração de resíduos e contaminação ambiental intra e extra-muros. Envolve a formação integral de funcionários, a humanização das empresas, o oferecimento de produtos e serviços que efetivamente favoreçam a vida humana e não humana dentro e fora dos muros da empresa.

No repensar a empresa para a minimização de resíduos e redução da geração na fonte envolve do ponto de vista técnico: a eliminação/redução do uso de matérias primas com atenção especial para susbstâncias tóxicas, melhoria nos procedimentos operacionais e na aquisição e estoque de materiais; uso eficiente de insumos tais como a água e a energia, reuso/reciclagem dentro do próprio processo, a adoção de tecnologias limpas e melhoria no planejamento dos produtos e a formação/capacitação de profissionais. De todos os itens acima citados, considero o mais desafiador a formação/capacitação de profissionais. Dentro da cultura atual, investir U$150 milhões em máquinas de última geração é muito mais justificável e aceitável do que investir igual valor na formação de profissionais. Um dos resultados dessa cultura de baixo investimento em Educação são empresas que operam com máquinas do século XXI operadas por cabeças do século XVII, profissionais e gestores da área ambiental com pouco ou nenhum hábito de consultar revistas científicas e pouca ou nenhuma visão sistêmica. A falta de embasamento técnico-científico e visão sistêmica também pode ser observada em profissionais de ONG e educadores ambientais.

Uma empresa é formada antes de tudo por pessoas que tomam decisões todo o tempo. O investimento na formação humana integral de profissionais, onde o conhecimento técnico e a alfabetização científica estão inseridas, é fundamental para o desempenho profissional dentro de uma organização no século XXI. Apostar em equipes bem formadas é apostar em prosperidade organizacional. Se parte da educação dos funcionários deveria estar sendo dada pelo Estado, é hora das empresas cidadãs cobrarem maiores investimentos na Educação Brasileira. Bom para o bolso do empresário. Bom para a saúde e bolso do funcionário, dos clientes e para as gerações futuras.

Publicado na Revista Eletrônica do Ietec/2006

Deborah Munhoz – Mestre em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos pelo DESA – EEUFMG; especialista em Bio-Sistemas Organizacionais pelo Instituto Orior, Bacharel em Química pela UFMG. Professora de Ecodesign e Produção Mais Limpa do curso de Pós Graduação em Engenharia Ambiental Integrada do IETEC e facilitadora da Rede Mineira de Educação Ambiental e da Rede Brasileira de Educação Ambiental.